Nasceu em Lisboa, Belém, e vive na Estrela, “entre as sombras do jardim e a mirada da Basílica”. Dedica à sua cidade o olhar do arquiteto, quando diz que ela “resiste aos maus tratos” de quem a habita, mas também o olhar do filósofo, quando refere “o labirinto da saudade” de Eduardo Lourenço ou a identifica com “a esperança que um dia vimos no mar”. O arquiteto que aponta como principais realizações pessoais os dois filhos, os dois livros e várias árvores, projeta para o seu futuro “cuidar dos filhos e das árvores” e continuar a “olhar, reparar e pensar, para conseguir fazer boa arquitetura e talvez escrever sobre as grandes questões de a fazer”. Na entrevista que se segue, Ricardo Zúquete deita um olhar atento à cidade e às suas particularidades e indica as suas moradas preferidas. Sigamo-lo.
Quais os bairros de Lisboa que o visitante não pode deixar de conhecer?
Duas Lisboas: a da promenade, da descoberta intrigante do passeio a pé, pelas ruelas, vistas surpreendentes, descobertas que parecem únicas no “enredo” visual das colinas. E a outra, que se descobre de bicicleta, de lambreta, ou menos poeticamente, de automóvel; a que se lança pelos grandes eixos de expansão da cidade, desde a Baixa Pombalina até às Avenidas Novas, da Lisboa cosmopolita do início de século vinte.
A pé, tudo que se desvenda desde a colina do Castelo: a Graça, Alfama e São Vicente. Deve-se depois descer a Mouraria até à Baixa. E depois suba-se ao Chiado até à história da Lisboa modernista. Mais adiante, pelo Combro, descobre-se o charme doce da burguesia da colina de Santa Catarina. A Norte, suba-se esse bairro, chamado Alto, nas antigas moradas de pescadores, hoje muitos bares , restaurantes, boutiques trendy e alternativas ao comércio banalizado. Ao fim da sua Rua da Rosa chegamos ao renovado Príncipe Real, do seu lindíssimo jardim, mais comércio diferenciado, sobre o desenho de fachadas antigas e algumas nobres que lhe compõem um carisma único na cidade. Depois podemos descer a São Bento e a Santos, e do vale subir à Madragoa, o bairro das varinas, das ruelas escuras e esculpidas na colina. A outra Lisboa, aquela que se descobre pelo carro, principia depois da Baixa, pela Praça dos Restauradores que abre a Avenida da Liberdade como um corredor a norte que desenha o futuro da cidade moderna até ao devir das Avenidas Novas. Sobe-se de carro e o melhor é ir vendo, ir parando, percebendo se esse futuro foi bom, talvez descobrindo que nem todo foi, como em todas as velhas cidades desta Europa.
Só em Lisboa encontra…
O dramatismo das colinas. O brilho, brilhante ou triste das fachadas. Um rio que é quase um mar entre terras, o melhor paladar que se pode experimentar, um vento que desenha ruas, a pedra de lioz dos conventos que são a história e os ensaios cosmopolitas de um lugar antigo que procura futuro. O cheiro e o fumo das castanhas, o ruído dos eléctricos, as estranhezas da calçada portuguesa, o sabor do café e do bom pastel de nata. E os lisboetas: simpáticos, de “coração na boca”, recebem generosamente (às vezes mesmo sem saberem como isso se faz).
Um dia perfeito em Lisboa é assim…
Cedo ir espreitar o sol a nascer sobre a colina da Sé. Não ir para o rio mas adivinhá-lo enquanto se procura o conforto das ruas, dos cafés, das lojas. “Fazer o Chiado”, com dizia Pessoa, desde os cafés do Largo, ver os turcos e alinhados de sempre da Paris em Lisboa, descer à Bertrand, aos livros que apetecem. Ir cumprimentando as pessoas conhecidas, espreitando as montras, ver quem entra e sai das igrejas, espreitar a Rua Ivens, e em frente aos Armazéns do Chiado decidir se à esquerda p’ro Rossio, se à direita p’ro Terreiro do Paço. Talvez p’ra direita para passar no Terreiro, e sobre as arcadas, cheirar o rio e os barcos que talvez passem, para preparar o almoço no Martinho da Arcada. E depois subir a Rua Augusta até ao Rossio, perceber a passagem aos Restauradores, em passo lento, para ir apanhar o Ascensor da Glória. Entre turistas galgar a colina para chegar à vista incrível da avenida desde os terraços do jardim de São Pedro de Alcântara. Seguir para o Príncipe Real a sentir o ambiente das lojas, dos turistas, esplanadas, mas com a ideia de ir a caminho do teatro. Comprar bilhete para o Teatro da Politécnica e tomar depois um óptimo Kir Royal no The Decadente, para discutir o provável enredo da peça. Podemos continuar descendo pelas ruas do Bairro Alto para jantar e beber um copo. E se a noite for dessas, descer até à Rua Rosa para dançar todos os males no Jamaica.
Lugares que não podemos deixar de visitar em Lisboa?
Um monumento: Igreja de São Roque.
Um museu /espaço cultural: Fundação Calouste Gulbenkian.
Um jardim: Jardim da Estrela.
Uma vista da cidade: São Pedro de Alcântara.
Os melhores hotéis?
O Ritz, hotel que seria a imagem de Portugal cosmopolita dos anos 50.
Os melhores restaurantes?
De cozinha de autor: Restaurante Aura.
De cozinha portuguesa: Restaurante Martinho da Arcada.
De peixe e marisco: Restaurante Sea Me.
De cozinha do mundo: Restaurante Esperança e Nómada.
Para petiscar: Restaurante Carmo.
Para comer a “bom preço”: Honorato.
Para comer fora de horas: Galeto.
Para apreciar a vista: Restaurante Via Graça.
Os melhores cafés: Benard.
As paragens obrigatórias na noite?
Bares: The Old Pharmacy Wine Inn, Maria Caxuxa, Arte 8 Bar.
Esplanadas: Benard uma esplanada sobre o Chiado, Espaço Espelho de Água, uma esplanada sobre o Tejo.
As melhores lojas para fazer compras?
Moda: Fashion Clinic; as novas lojas do Príncipe Real; El Corte Inglés.
Lojas de produtos portugueses: Alma Lusa.
Gourmet / garrafeiras: Club del Gourmet.
Outras: Fnac.